quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Santa Cruz do Capibaribe e a relação entre educação e trabalho

Santa Cruz do Capibaribe é uma cidade industrial e comercial. É também uma cidade extremamente democrática no que se refere a oportunidades. Nela, todos têm acesso à renda. Em outras cidades, há uma relação muito próxima entre o estudo e o trabalho. As pessoas sabem que se não se qualificarem, se não estudarem, estarão excluídas do mercado de trabalho, cada vez mais exigente.

Em Santa Cruz, essa relação praticamente não existe. A indústria local consegue absorver pessoas sem educação formal, sem passagem pela escola. Basta aprender a atividade mecânica da costura, do corte de tecidos, ou da retirada de pontas de linha que o sujeito facilmente se insere no mercado. Nas estamparias os indivíduos também não precisam dos conhecimentos das salas de aula. No comércio, habilidades mínimas de ler e contar são o bastante para a execução do trabalho. Nas feiras, a força física garante o sustento dos carroceiros.

Outro dia estava lendo um livro de um autor local (Israel Carvalho) e vi um dos mais bem sucedidos empresários de nossa cidade dizer que só freqüentou a escola por quinze dias. O perfil predominante do empresariado local ainda é o mesmo: pessoas com quase nenhuma educação formal, mas com uma habilidade enorme para os negócios, para gerar riquezas. Parece que em Santa Cruz, educação atrapalha ou é totalmente dispensável.

O efeito colateral do pouca atenção à educação se reflete no trânsito caótico, na política partidária imatura, na falta de uma política de coleta de lixo seletiva, na desatenção às questões ambientais, na ausência de programas de incentivo à cultura, na carência de ambientes urbanos que favoreçam o lazer e a prática de esportes, na falta de responsabilidade social das empresas (salvo raras exceções).
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Apesar das adversidades naturais (climática, hídrica, geográfica) conseguimos realizar uma grande façanha desejável por todas as cidades do mundo: oferecer trabalho e renda para todos. Em um contexto de crise econômica e financeira global, em que o capitalismo precisa ser redesenhado, talvez seja um momento favorável para nossa cidade dar outro salto, o da educação e da cultura.

2 comentários:

Débora Quetti disse...

Excelente consideração feita sobre o contexto social, econômico e político de nossa cidade. Concordo com as análises realizadas e o parabenizo por isso. Faltou expor o pouco incentivo e apoio dado aos que residem na cidade e que consiguiram vencer as barreiras impostas pela realidade a qual nos deparamos antes de ingressar nos estudos. Temos atualmente três faculdades em nosso município e um excelente doutorando como você. Mas parece ser mais concebível um doutorando de outra cidade para lecionar nas instituições de ensino superior, a um filho da terra. Fui aluna sua em um curso que fiz e digo sem medo de errar que fostes o melhor professor da área de linguas que conheci. És um poço de conhecimento, tanto empírico quanto teórico. Algumas coisas ainda me tiram do sério. Precisamos fazer concursos para fora, viajar para outros estados e até outros países para mostrar nossa capacidade de enfrentar os desafios que nos são impostos. Fui à Portugal apresentar um trabalho na Universidade do Porto sobre as políticas públicas de inclusão no Brasil e especificamente em nossa cidade. Ao voltar, sabe qual o comentário feito? Alguma pergunta sobre o que acharam de nossa educação na cidade? O que foi apresentado? Nada. A única coisa que comentaram, e por muito tempo, foi que eu tinha contraído a gripe suína! KKKKKKKK. Parece até brincadeira... Mas ninguém se interessou pelo conteúdo trabalhado no congresso. Interesse foi o demonstrado pelos ingleses, portugueses, escoceses e algumas pessoas da Hungria. Eles ficaram curiosos para saber de nossa realidade educativa e das políticas públicas de acesso e permanência nas escolas do país. Após a palestra houve um imenso debate sobre o Brasil e sobre a cidade de Santa Cruz do Capibaribe. Sei que com você e com outros estudiosos de nossa cidade não é diferente! Estamos no mesmo barco e a cidade em que moramos, apesar de não ter nascido aqui, dificilmente nos incentiva a ir em frente. Isso me faz lembrar do saudoso Professor Lindolfo, homem de um conhecimento inigualável, de palavras majestosas. Quantas vezes o município preparou uma solenidade para reconehcer tal talento? Quantas vezes o professor Lindolfo foi convidado a ministrar palestras e contar para todos seus ideais? É isso amigo! Mas,nunca perdemos a esperança! Paulo Freire deixou isso bem aceso e firme dentro de quem busca mudar o mundo com suas idéias. De quem anuncia e denuncia seu pensamento! Paz e saúde pra você sempre.

Marcelo Clemente disse...

Débora, que bom tê-la por aqui! Também admiro muito o seu trabalho, sua coragem e seu grande profissionalismo, coisa cada vez mais rara hoje em dia. Forte abraço!